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terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Ecumenismo, eclesiologia de comunhão (1ª parte)

O Diálogo

A vida humana possui por natureza uma tendência natural  para a pluralidade, cada individuo é único e esta 
 pluralidade presente no gênero humano se estende às crenças religiosas  compondo um verdadeiro universo religioso[1].
Hoje, há um aumento da consciência de reconciliação e diálogo entre as religiões, esta atitude é  fundamental para que a paz no mundo possa ser visível, inclusive no cristianismo.
Para os cristãos católicos a compreensão e a prática da eclesiologia de comunhão nos conduzem ao diálogo ecumênico. A relação com os irmãos e irmãs batizados de outras Igrejas e comunidades eclesiais é um caminho irrenunciável para o discípulo missionário, pois a falta de unidade representa um escândalo, um pecado e um atraso do cumprimento do desejo de Cristo. (DAp 227).
Na Conferência de Aparecida, a Igreja quando se refere ao ecumenismo, destaca o diálogo como parte de uma eclesiologia de comunhão, por isso o caminho indispensável do discípulo missionário é o diálogo,  este é grande desafio para que o ecumenismo de fato aconteça.
O fundamento do diálogo  esta na constatação de que existem ideias e ações diferentes originando  o pluralismo que não é algo negativo, mas leva ao crescimento a relação humana, pois, o processo de diálogo é uma forma de educar as pessoas, levando-as a conhecer mais a si e aos outros.
Para o diálogo, se pressupõe que o sujeito saiba quem ele é, qual a sua identidade e qual a identidade da igreja que pertence e inclusive saber o que é ser  Igreja. Sabendo isso, pode-se estabelecer a base para o diálogo transparente e verdadeiro com o outro. O diálogo ecumênico deve ter a atitude de acolhimento do outro e também o firmamento dos alicerces daquilo que se é e do que se crê.
Não existe diálogo sem escuta, sem sair de si mesmo e nem sem o desejo de comunhão[2].     
                                                                                                                                                                                          Compreensão Eclesiológica

 Um fator importante para o diálogo é o cristão ter  um conhecimento básico de eclesiologia, devido esta compreensão ser fundamental no caminho para o ecumenismo.
O primeiro passo para uma autocompreensão de Igreja  é saber que a Igreja dá-se a conhecer em duas dimensões:
No âmbito empírico; conhecimento  que  dá ao cristão capacidade de captar a Igreja como um dado de fato, uma instituição com uma estrutura organizativa  e com uma história concreta.
No âmbito normativo; conhecimento que vai além dos dados concretos e históricos, seria uma olhar “interior”, que é o olhar da própria fé que remete a um horizonte, um projeto, realidades que tornam o cristão envolvido e comprometido[3].
Ainda no âmbito normativo, no CAT a Igreja aparece antes da Igreja, ou seja, na vontade soberana do Pai e vista como a razão da criação veja:

O Pai eterno, por libérrimo e arcano desígnio de sua sabedoria e bondade, criou o universo; decidiu elevar os homens à comunhão da vida divina, à qual chama todos os homens em seu Filho: “Todos os que creem em Cristo, o Pai quis chamá-los a formarem a santa Igreja”. Esta “família de Deus” se constitui e se realiza gradativamente ao longo das etapas da história humana, segundo as disposições do Pai. Com efeito, “desde a origem do mundo a Igreja foi prefigurada”. Foi admiravelmente preparada na história do povo de Israel e na antiga Aliança. Foi fundada nos últimos temposFoi manifestada pela efusão do Espírito. E no fim dos tempos será gloriosamente consumada. (CAT. 759)

A Igreja foi prefigurada desde a origem do mundo pois, Deus criou todo o universo por amor e em vista de elevar o homem  a comunhão divina convoca todos os homens em Cristo[4]  esta convocação é a Igreja[5]. Com o pecado a comunhão entre os homens e Deus é rompida e  mesmo assim Ele não dá as costas ao  ser humano e mantém sua relação amorosa  percebida na história através da antiga Aliança, iniciada com a vocação de Abraão e a eleição de Israel como sinal de preparação da reconciliação futura entre todas as nações. Diante da infidelidade de Israel à antiga Aliança, Cristo institui a nova e eterna Aliança dando cumprimento a palavra dos profetas[6].O Filho na encarnação realiza em sua missão o plano salvífico do Pai por meio  da pregação do advento do Reino de Deus[7].  O início deste seu Reino se dá pelo pequeno  rebanho constituído por Doze homens convocados em torno de si, a qual é ele o Pastor[8].
Esses Doze representados por Pedro são pedras de fundação para sua Igreja, eles participam da missão de Cristo, que é realizar o plano de Salvação de seu Pai, é a partir da escolha dos Doze que Cristo prepara e constrói sua Igreja[9].
Esta Igreja por ser “convocação” de todos os homens para a salvação, é por sua própria natureza, missionária enviada por Cristo a todos os homens e para realizar sua missão, é o Espírito Santo que a fortalece e conduz por meio da sua diversidade de dons e carismas[10]. Sendo a Igreja instrumento de Cristo, ela torna-se instrumento da Redenção e sacramento universal da Salvação.
Além dessa realidade missionária dentro da compreensão eclesiológica está a expressão “Igreja Una” que significada uma só Igreja de Cristo. Esta compreensão de Igreja existe também entre os ortodoxos, anglicanos e evangélicos.
A unicidade da Igreja se dá pelo fato de haver um só Deus e por isso um único povo de Deus, um único rebanho, da qual Cristo é o único Pastor, o único mediador, por isso ele é cabeça do único corpo que é a Igreja.
A unidade é um segundo significado da expressão “Igreja una”, esta unidade se dá por meio da coesão espiritual dentre seus membros no único povo de Deus, por isso a Igreja é indivisa em si mesma.
Este fundamento da unidade e unicidade da Igreja de Deus tem como modelo a Trindade, Deus uno e trino, e a unidade dos cristãos é criada à imagem e semelhança da Trindade[11] que é um único Deus em três pessoas distintas entre si por suas relações de origem, porém a distinção das pessoas da trindade reside unicamente nas relações que as referem uma às outras, contudo, as pessoas da trindade não se dividem entre si, mas cada uma delas é Deus por inteiro.[12]
A unidade da Igreja se manifesta na sua diversidade sem eliminar as diferenças, buscando sempre o respeito e a promoção tendo como base o modelo trinitário[13].
A exigência desta unidade é manifestada visivelmente em At 2,42-47, nesta passagem se fundamenta a doutrina eclesiológica da tríplice comunhão.
- A comunhão na profissão de fé (ensinamento dos apóstolos).
- A comunhão no culto divino.
- A comunhão fraterna.
A unidade da Igreja é, portanto, uma unidade de fé, de culto e vida social[14].
A busca da unidade cristã dentro da história do cristianismo sempre se fez presente a fim de manter os cristãos na fidelidade do Evangelho, portanto, é essencialmente cristão esse desejo de um testemunho comum da mensagem evangélica.
Sabe-se que desde os primeiros séculos da história do cristianismo divergências e debates aconteceram,  mesmo diante situações de conflitos, crises e divisões não deixou de haver o esforço de reconciliação no meio cristão.
Porém, não foi possível evitar as duas grandes cisões da Igreja, a primeira em 1054 com a Igreja Oriental e a segunda em 1517 pelos reformadores protestantes. Com isso tem-se  quebrada a unidade da Igreja e hoje há a necessidade de restabelecer à comunhão.
A partir do Concílio Vaticano II a consciência de ecumenismo mostrou o tamanho da exigência dessa realidade entre os cristãos, o próprio concílio reconheceu-se culpado da  quebra da unidade,  o papa João Paulo II relembrou o que disse o Vaticano II, “é um escândalo  para o mundo a divisão entre os cristãos”[15].
Para entendermos e vivenciarmos essa necessidade entre os cristãos  é necessário saber o que é ecumenismo? De onde vem essa expressão? O que o concílio vaticano II nos propõe?
                      



[1] ANTONIO DE SOUZA, Rui; Mundo Jovem, nº 343, fevereiro de 2004, p.19.
[2] BESEN, José Artulino, O universo religioso: as grandes religiões e tendências religiosas atuais, São Paulo: Editora Mundo e Missão, 2008.p.215 e 216.
[3] ALMEIDA, Antonio José de, Sois um em Cristo Jesus, São Paulo; paulinas, Valência, SP; Siquem, 2004. (Coleção livros básicos de teologia; 8,1) p.13.
[4] Cf. CAT. 759.
[5] Cf. CAT. 760.
[6] Cf. CAT. 762.
[7] Cf. CAT. 763.
[8] Cf. CAT 764.
[9]Cf. CAT 765.
[10] Cf. CAT 768.
[11] ALMEIDA, Antonio José de, Sois um em Cristo Jesus, São Paulo; paulinas, Valência, SP; Siquem, 2004. (Coleção livros básicos de teologia; 8,1) p.43.
[12] Cf. CAT. 253 e 255
[13] Ibid., p.43.
[14] Ibid., p.44.
[15] JOÃO PAULO II Carta encíclica “Ut unum sint” do santo padre João Paulo II sobre o empenho ecumênico. 2ª Ed. São Paulo: Paulinas, 1995.nº 5.

Abreviaturas: CAT (Catecismo da Igreja Católica)

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